sexta-feira, 4 de junho de 2010

O Demônio

"Quando não me era ainda insossa
cada impressão da vida outrora
- rumor de bosque, olhar de moça,
canção de rouxinol na aurora -
e quando a liberdade, o amor,
a glória, as artes, o melhor
da inspiração e altas idéias
turvavam-me o sangue nas veias,
um certo espírito nefando,
trazendo angústia e me anuviando
horas confiantes de prazer,
passou, em sigilo, a me ver.
O nosso encontro era sombrio
e ele sorria com o olhar
cheio de escárnio ao me instilar
dentro da alma um veneno frio.
Pois caluniava sem receio
e desafiava a Providência,
julgava o Belo - um devaneio,
a Inspiração - tolice imensa,
o amor e a liberdade - vis.
E, olhando altivo, com profundo
desprezo, a vida, ele não quis
abençoar nada em todo o mundo."

Aleksandr Sergueievitch Púshkin, poeta russo.

tradução de Nelson Ascher e Boris Schnaiderman.

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