terça-feira, 22 de setembro de 2009

O Brinquedo

O destino me possibilitou nascer numa família em que nunca me faltou as necessidades básicas e sou muito grato por isso. Quando criança, tive à disposição uma vasta gama de brinquedos e videogames, pude estudar em colégio particular e ter boa alimentação. Por esses dias, estive recordando os brinquedos que fizeram parte da minha infância. Era uma criança que gostava de destruir tudo, não tinha muito zelo. Até hoje, minha mãe diz que gastou tanto pra comprar um carrinho "bate e volta" e no segundo dia, o carro já estava quebrado e desmontado. Antes isso tivesse aguçado em mim a aptidão de ser um engenheiro ou coisa parecida, mas não, não disponho do menor dom de consertar qualquer objeto. Mas, entre todos os presentes que ganhei, houve um que me chamou mais a atenção. Brincava com ele o dia todo, dentro de casa, na rua, levava pra casa dos primos e etc. Tratava-se de um globo terrestre.

Era um globo grande para uma criança de 6 anos, apertava-o contra a barriga e o peito. Era de plástico e podia jogá-lo contra a parede que ele voltava, chutá-lo e tudo mais. Dormia ao lado da minha cama. Minha maior diversão era arrmessá-lo para o alto e onde meu olhar fixasse um ponto, decorava o país e a capital. Aprendia o nome das cidades grandes de cada país. E nessa brincadeira, em pouco tempo, eu já sabia praticamente todas as capitais dos países do mundo. Naquele tempo, década de oitenta, a União Soviética não havia se desintegrado, a África tinha países com nomes diferentes dos atuais, como a Rodésia, por exemplo. Mianmar era Birmânia. Havia duas alemanhas. Mas, aos poucos e sem compromisso, fiquei sabendo quase todas as capitais e onde cada país se localizava, o nome dos lagos, dos mares, das ilhas do pacífico, dos estreitos e terras de príncipes da Antártida. Meus tios chegavam aqui em casa e ficavam me desafiando: Odomirinho, qual a capital da Indonésia? Prontamente, eu respondia: Jacarta, na ilha de Java. Lembro-me do meu tio Edwind, gritando com seu sotaque nicaraguense: Heya! Tem que levar esse menino pro Faustão!

Com o passar dos meses, meus primos vinham aqui pra casa e eu ficava ensinando as capitais do mundo pra eles, aplicava provas e deixava até alguns em recuperação! Tinha uma pequena lousa com giz no meu quarto. Depois de um ano, o globo estourou e como eu já estava ficando maiorzinho, passei a comprar os exemplares do Almanaque Abril. Na casa do meu avô, aqui perto no Engenho do Meio, tinha a coleção completa da Mirador Internacional, onde eu me deitava na sala a observar as fotos e os textos sobre os diferentes países ao redor do mundo. Meu avô era um grande entusiasta e me deixava brincar à vontade, mesmo quando uma tia, por (des)ventura, reclamava: vai sujar esses livros que Toinho deu pra papai!

Ainda nos dias de hoje, recordo-me de muita coisa que aprendi naquela infância, hoje distante. Não posso negar que as diferentes culturas ao redor do mundo me fascinam. Não que seja uma estúpida admiração em contraponto à cultura brasileira, mas me encanta saber que conjuntos de pessoas puderam dar diferentes significados em seu modo de se posicionar perante a natureza. Um dos livros que mais me impressionou nos últimos tempos (acho que já falei dele em algumas postagens anteriores) é o Il Milione de Marco Polo, onde ele faz um riquíssimo relato sobre o mundo oriental no século XIII, os costumes de cada cidade, sua localização geográfica e suas riquezas naturais. Posteriormente, Italo Calvino continuou essa viagem no livro Cidades Invisíveis. E também nós podemos continuar essa travessia, porque o mundo aí está, carente de nosso olhar e respeito. Um certo dia, estive num deserto perto da divisa da Argélia com a Mauritânia, a noite mais estrelada que um citadino jamais vira, não tinha medo de estar perdido, nem mesmo sabia como estivera alí...

Um comentário:

Carlos Maia disse...

Pois é, Dodô, posso imaginar como foi a sua emoção, a noite mais estrelada que eu já vi foi numa cachoeira à 80 Km de Brasília, Topázio. A via-láctea parecia uma nuvem de tanta estrela...