Vocês, caros amigos, que tem visitado meu blog desde que ele foi lançado há 1 mês, devem ter percebido meu flerte com a World Music, com a cultura de povos distantes e até meu desapego com a origens da identidade nacional. Pois bem, achei justo que vocês também conhecessem um outro lado das minhas preferências musicais, cujas raízes (ui, Rodrigo!) se encontram na música regional. Agora, vamos nos deparar com uma série de questões a levantar: A música regional brasileira é autêntica? E se não for, isso constitui um problema? Não seria a maior riqueza da música brasileira a pluriculturalidade?
Fico muito chateado quando encontro pessoas que vem com aquele discurso fabricado, mais ou menos assim: "Pô, eu só escuto música brasileira. Tenho que dar valor às coisas do meu país. Não gosto de nada que venha do estrangeiro." Ora, pensar assim é uma tremenda contradição, penso eu, já que nosso país é rico pela mistura incomum de elementos mouros, europeus, africanos, indígenas e quem sabe mais o quê. O Brasil não precisa ter identidade, porque assim, será residência de passagem de infinitas possibilidades. Ao meu ver, temos que ter senso crítico, não identidade.
Quando resolvi postar nesta tarde de quarta-feira, estranhamente nublada do fim de Novembro, me propus a escrever sobre artistas da música brasileira, que vez por outra são classificados como regionais, armoriais, sertanejos e etc. Mas que para mim, transcendem as expectativas de definição de gênero. Nos últimos dias tenho estado com a cabeça muito cansada. Hoje, quando cheguei da universidade, não foi diferente. Mas, ao invés de correr para os livros (o que seria mais correto), deitei-me no chão frio do meu quarto e fiquei escutando um disco de um autêntico artista "regional", Rolando Boldrin. Que maravilha, meus amigos! Rolando Boldrin foi, por muitos anos, apresentador do Som Brasil que passava na Rede Globo. Uma das imagens mais vivas da minha infância era que eu acordava muito cedo nos domingos, tão cedo que quando não assistia o Corujão III, assistia o desenho do Picolino. Logo na sequência passava um programa que meu pai não perdia por nada, o Som Brasil, com sua famosa abertura: "Amanheceu, peguei a viola, botei na sacola e fui viajar..." Meus pais são naturais da República da Estrela (isso dá outra postagem!), que são as cidades de Boa Ventura e Curral Velho, no Vale do Piancó, Paraíba. "Sertão das muié séria e dos hômi trabaiadô".
Dia desses, outra imagem da infância reavivou em mim, foram os filmes dos anos 80 dos Trapalhões. Os Trapalhões e o Mágico de Oroz. Lembro-me de Didi Mocó (Renato Aragão) e Soró (Arnaud Rodrigues) tendo a casa guinchada por um jumento no alto sertão cearense. Pois bem, esse mesmo Arnaud Rodrigues, serratalhadense, é um dos grandes artistas da música nacional, que além da valorosa carreira solo, criou em dupla com Chico Anísio, o mui original Baiano e os Novos Caetanos, cujo primeiro álbum de 1974 é uma das flores mais preciosas da música brasileira. Aqui em Pernambuco, como não destacar os armoriais da Banda de Pau e Corda, com letras poéticas e melodia irretocável.
Devido à influência dos meus pais, também tenho que destacar a influência do forró no meu gosto musical, embora não saiba dançar sem pisar no pé da minha companheira, e olhe que uma pisada minha deve doer! Luís Gonzaga sempre foi de lei aqui em casa. Músicas como "Frei Damião", "Meu Araripe", "Pau de Arara", "A Mula Preta" e por aí vai, ainda me emocionam. Aliás, me emocionam mais do que nunca, pois lembram um tempo bom que não voltará. Trio Nordestino e Assisão. Este último é um forrozeiro daqueles de levantar poeira de qualquer terreiro (Quem dança em terreiro hoje em dia?). Neste último São João eu estava em Gravatá e quem estava tocando lá na noite de São João? Quando escutei a primeira música pensei: "Eita, tão tocando a música de Assisão!" E o tal cantor continuou na sequência, cheguei mais perto do palco e pude ver que era o próprio Assisão que estava tocando, bem mais velho que a capa dos LP´s que meus pais tinham. Não resisti, liguei pra mainha e disse a ela que tava num show de Assisão em Gravatá. Ainda hoje aqui em casa, Assisão toca pelo menos uma vez por semana. Mas, não em LP, gravei um disco de MP3 com umas cento e cinquenta músicas dele.
Sá e Guarabira, Quinteto Armorial, Ednardo, Belchior, Pinduca... São alguns dos artistas nacionais que reverencio de coração. Estou escrevendo isso pra evitar os rótulos. Morro de medo de ser rotulado. Já pensaram, eu passando pelas ruas e o povo dizendo:"Eita, lá vai aquele cara que só escuta Heavy Metal da Ucrânia." Embora eu goste de umas duas bandas de Metal da Ucrânia, acredito que ultrapasso essas barreiras, além do mais, que bom que existe boa música pra que a gente possa ouvir em diversas ocasiões. Ah, chega de me retratar! Minha convivência com o DJ Portanov não deixa que eu caia em monotonia musical, mesmo que chamem isso de falta de autenticidade. Um abraço nos amigos e um beijo nas amigas que passam por este caminho.
obs: Depois que o SomBarato foi detonado, fiquei meio orfão de sites de download de música brasileira. Quer dizer, estava, agora achei esse. Vou "jogar" vocês na página de Rolando Boldrin, mas tem centenas de discos de dezena de artistas:
aproveitem e se alguém cobrar, bota na conta de Tião Galinha!
3 comentários:
que lindo meu caro, confesso que fiquei com receio de onde essa dita retratação pudesse parar, mas a frase: "Ao meu ver, temos que ter senso crítico, não identidade." me tranquilizou, pois, matêm a inquietude, mãe da crítica e alimento do pensamento. eu também aproveitarei pra declarar minhas paixões "regionais", dentre tantos músicos, poetas, artistas plásticos, pra mim o maior: Elomar Figueira de Melo. Sim, sim. a defesa que faço da arte é muito simples, ela corta, toca, doí, faz pensar, tremer, sorrir e sangrar, então tudo certo. e é até estranho pensar que algo imaterial como o som possa ser de modo tão esqemático regionalizado, territorializado em geral, mas vou parar de falar... essas madrugadas... bjus e inté o Show de Tom Zé, que nem gosto tanto... ahahahah. sim vai o link de um blog só de música experimental brasileira dos idos 60 e 70: http://brnuggets.blogspot.com/
Dodô, muito bom o seu texto. Mas, como sou estudante de filosofia, destaco uma das tuas frases de que gostei muito.
"O Brasil não precisa ter identidade, porque assim, será residência de passagem de infinitas possibilidades."
Abração e parabéns pelos textos...
isso é pura autenticidade
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